Sunday, September 20, 2009

Ainda pode descer

Estive há dez minutos atrás na varanda do meu quinto andar, a observar a cúpula invisível entre o céu e o enorme lego de betão e a sentir-me um inquilino passageiro desta pensão de duas estrelas perdida na imensa cidade negra a que damos o nome de universo.
Curiosamente parece que é o único sítio que temos para passar a longa noite que nos espera.
E é aí que eu saio para apanhar a frequência. No meu prisma, a encaixar, provavelmente no de outros feito um filósofo de merda.
Mas a vida é isso mesmo, um monte de gente a fazer de conta que se entende e ninguém sabe dizer o que viveu.
Por isso nos pedem que caminhemos alegres para o precipício sem questionar, porque estaremos sempre longe. Mas longe rapidamente fica perto e perto passa por nós. Eu não quero mandar-te para baixo, mas eu sei que me entendes, tu também tens medo de morrer, toda a gente tem. Só que normalmente inventamos montes de problemas para nos convencermos que estamos ocupados a resolver uma situação importante quando não tem importância nenhuma.
Entretanto o tapete rola e nós irritamo-nos com a nossa inevitabilidade, e nos nossos sonhos dizemos: - Torna-me imortal! Torna-me imortal! Eu não vou aguentar deixar de existir!
E é aí que eu entro para sair da frequência, seduzir-te com os meus sonhos, tu não vês como empreendo? E como eu mais um milhão de sonhadores leva com ele muitos braços de outros, acéfalos, na lotaria dos ideais, descrentes, beijando o número do bilhete.
Mas quero dizer-te que a viagem é tua, não quero empurrar-te à força para a rua.
Se eu falhar vou passar de deus a carrasco, embalsamado e metido dentro de um frasco, para te lembrares da mentira, mas a verdade é que ganhamos sempre.

Foge foge bandido





A importância do que nos vai acontecendo e do que fazemos acontecer é ilógica e fortemente condicionada pela dimensão social que nos envolve. Por exemplo, porque carga d'água é que um sonho estúpido que tive lá para os meus 8 anos, no qual figuravam piratas que queriam roubar as minhas cassetes de vídeo da Disney me marcou tanto? Porque é que ainda me lembro daquilo? Por outro lado, porque é que não guardo a mínima recordação do dia em que entrei para o ballet? Lembramo-nos de coisas tão estranhas e que julgamos de pouca pertinência no decorrer da nossa vida, enquanto nos esquecemos de momentos que julgamos definidores da nossa identidade.
A questão que se coloca é até que ponto podemos fazer este julgamento, esta separação entre momentos-chave da nossa vida e momentos banais. Uma situação que julgamos banal pode ser de extrema importância e após todos estes anos não conseguirmos - ainda não conseguirmos - ver porquê.

Por isso, talvez, aquele dia, aquela noite, não tenha sido um momento-chave. Talvez não tenha sido um ponto de escolha de um caminho entre os vários que o emaranhado do destino me oferecia.

Espero que não.

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